A substância do brincar é a alegria.
Lydia Hortelio
Que as crianças brincam é sabido.
Agora, o desenrolar das brincadeiras e as pistas de como as nossas crianças estão fluindo em seu crescimento no mundo – perceptíveis pela observação e escuta atenta desse brincar – muitas vezes nos passa despercebido.
O brincar é essencial para o desenvolvimento integral das crianças. Tão essencial que é considerado direito.
Nesse texto, que convida a acompanhar a programação da Semana Mundial do Brincar de 2021 e celebra o quinto aniversário do Marco Legal da Primeira Infância, vamos contar de que brincar falamos, sua importância e como se constitui no campo dos direitos.
Brincares
Em casa, na rua, na praça. No caminho pra escola, de ônibus, de carro ou a pé. Na hora do banho, durante o almoço, indo pra cama. As crianças brincam o tempo todo, em qualquer lugar, com e sem objetos específicos. Agora, durante a pandemia, brincam em suas casas.
É possível sim que, brincando, conquistem novas habilidades e novos aprendizados (e isso vai acontecer), porém, não é por isso que o brincar é essencial para o desenvolvimento integral das crianças.
O brincar de que falaremos aqui é entendido como toda manifestação espontânea que parte da criança e em que ela é a protagonista. É o brincar que tem um fim em si mesmo e não um meio para finalidades específicas de aprendizagem. Tem prioritariamente um caráter de liberdade, espontaneidade e alegria.
Brincar de maneira livre, nos diversos espaços por onde passam, possibilita a manifestação subjetiva das vontades e da criatividade. Brincando, a criança conhece o mundo e se reconhece nele. Se comunica e expressa suas impressões, elaborações e sentimentos.
Assim, observar ou participar de alguns desses momentos pode nos oferecer uma leitura sobre a maneira própria e única de como a criança está conhecendo o mundo e lidando com os padrões socioculturais do seu entorno.
Mas é muito importante, como adultos, sabermos o nosso lugar nesse brincar. É preciso termos a compreensão de que o mundo interno da criança é constituído a partir de uma realidade percebida por ela que não necessariamente condiz com as nossas percepções. Em seu modo de interagir, apropria-se de movimentos, cenários e objetos diversos que podem se prestar aos mais variados fins a partir de sua inventividade e imaginação. Essas experiências mobilizam sensações e sentimentos muito particulares, que carregam a sabedoria de cada criança.
Dessa maneira, outro tempo faz-se necessário, e também a confiança em nos deixar sermos conduzidos pelo mundo de mistérios de nossos pequenos.
Brincar como direito
O brincar é tão essencial ao seu desenvolvimento integral que é considerado, por lei, direito fundamental das crianças, assim como o direito à moradia, cultura, saúde, educação, lazer, respeito, liberdade, etc.
Os direitos das crianças e dos adolescentes são conquistas importantes e relativamente recentes na história. Não pretende-se aqui um aprofundamento no caminho percorrido até a atualidade, e sim relatar como entende-se o brincar hoje no âmbito legal.
De maneira resumida, partindo-se do artigo 227 da constituição Federal de 1988, em que os direitos das crianças, adolescentes e jovens são tidos como dever e prioridade absoluta da família, estado e sociedade; passamos, em 1989, pela Convenção sobre os direitos da criança e do adolescente e em 1990 temos a criação do Estatuto da Criança e do adolescente, o ECA.
Composto por mais de 260 artigos, o ECA é resultado de um processo histórico de estudos e conquistas no âmbito das Nações Unidas e é fundamental para a proteção integral de garantia de direitos de todas as crianças e adolescentes.
E, mais recentemente, há apenas 5 anos, foi elaborado o Marco Legal da Primeira Infância – a lei mais atual para a orientação em relação aos direitos das crianças. Nele, dentre outras diretrizes, fica definido que o brincar está no mesmo nível em que se encontram as demais prioridades. Vale aqui transcrever o artigo 5º:
Constituem áreas prioritárias para as políticas públicas para a primeira infância a saúde, a alimentação e a nutrição, a educação infantil, a convivência familiar e comunitária, a assistência social a família da criança, a cultura, o brincar e o lazer, o espaço e o meio ambiente bem como a proteção contra toda forma de violência e de pressão consumista, a prevenção de acidentes e adoção de medidas que evitem a exposição precoce à comunicação mercadológica.
Na prática, isso significa, por exemplo, que o Estado (nas esferas municipal, estadual e federal), a sociedade civil organizada e as instituições privadas devem garantir estratégias e implementações para que: todos os locais sejam seguros e passíveis de uso e convivência por todas as crianças; existam espaços públicos destinados ao brincar livre e inclusivo; as escolas considerem o brincar nos eixos estruturantes de suas práticas pedagógicas, entre outras ações possíveis.
Essa formalização por meio das leis resulta de uma compreensão das crianças como pessoas de direitos e construtores de cultura que se desenvolvem no âmbito geral de toda a sua comunidade.
E ela vale para todas as crianças. Porém, diante da diversidade entre as crianças e em uma sociedade marcada por profundas desigualdades, muitas são privadas de vários de seus direitos. Dentre alguns exemplos de formas de negligência ao direito de brincar podemos citar:
• Crianças em situação de vulnerabilidade social podem não ter acesso a espaços seguros, alimentação adequada, ambientes de não violência. Esses fatores impossibilitam que fruam em liberdade o seu brincar;
• Meninas que precisam contribuir com atividades domésticas e com cuidado de irmãos mais novos;
• Meninos que são impedidos de brincar de “brincadeiras de menina” e vice-versa;
• Crianças com deficiência que, muitas vezes, são privadas de brincar em espaços comuns pela falta de adaptações necessárias para que o convívio aconteça;
• Crianças com muitos compromissos (cursos, aulas, terapias e afins) que podem ficar sem tempo para o brincar;
• Escolas com diretrizes curriculares que não integram o brincar como prática pedagógica.
Pode-se perceber que ainda são muitos os desafios a serem superados para que se possa garantir a todas as crianças a oportunidade de crescer e conviver em liberdade para criar, para se experimentar como um ser de relações em todos os espaços onde se dão a vida individual e coletiva da humanidade.
Semana Mundial de Brincar
Um dos grandes desafios em relação a esse tema, é a compreensão e valorização do brincar como ação fundamental ao desenvolvimento humano.
A Semana Mundial do Brincar, que é celebrada no Brasil desde 2009 pela Aliança pela Infância, de quem o Sesc São Paulo é parceiro desde 2013, tem como objetivo a sensibilização sobre a importância do brincar como um direito. Em 2021 o projeto acontecerá de 22 a 30 de maio com o tema “Casinhas das Infâncias”- uma referência ao brincar de casinha, com um olhar especial para os tempos de pandemia.
Segue aqui a programação do Sesc Avenida Paulista e nosso convite a ter você conosco para refletir e enriquecer os debates e também, certamente, para brincar!
Roda de Conversa
“Estou te vendo! Observações e escutas do brincar em casa”
Com Renata Meirelles e Reinaldo Nascimento e mediação de Anne Binder
Como brinca sua criança nesse período da pandemia? Observar as crianças brincando, além de encantamento, pode nos trazer muitas pistas de como elas têm incorporado o mundo e as situações. Nesta roda de conversa, Renata Meirelles e Reinaldo Nascimento contam sobre a pesquisa “Brincar em Casa” que resultou em um média metragem e uma série de podcasts, e trazem reflexões sobre o brincar nesse período. Com a mediação de educadoras das equipes infantojuvenil e físico-esportiva da unidade, o espaço estará aberto para compartilhamentos e dúvidas entre os participantes.
Renata Meirelles coordena o projeto de pesquisa Território do Brincar, um patrocínio do Instituto Alana, e é idealizadora do projeto Bira – Brincadeiras Infantis da Região Amazônica. É diretora de filmes de longa, média e curta metragens, e autora dos livros como Giramundo – e Outros Brinquedos e Brincadeiras dos Meninos do Brasil (2007) e Cozinhando no Quintal (2009), entre outros.
Reinaldo Nascimento é terapeuta social e educador físico. Como integrante da equipe internacional da Pedagogia de Emergência, coordenou ações em diversos locais, como Quênia, Faixa de Gaza, Curdistão-Iraque, Estados Unidos, Moçambique e Brasil (Brumadinho/MG) e. Trabalha na formação de professores e educadores no Brasil, na Suíça, na Alemanha, nos Estados Unidos e na Colômbia, entre outros países.
Anne Binder e Cecília Mogadouro são educadoras da equipe infantojuvenil, Rafaela Cordeiro é educadora da equipe físico esportiva do Sesc Avenida Paulista.
A partir de 16 anos. Inscrições a partir de 21/5. Encontro pelo Teams.
Dia 26/5, quarta, às 19h
Oficina
“(En)cantos do Brincar em Casa”
Com Laís Bim, Mariana Grifo, Rafaela Cordeiro e Bruna Paiva
Descobrindo novos usos para alguns objetos comuns das casas, iremos brincar com movimentos e investigar as possibilidades destes materiais no corpo, no espaço e em relação com outra pessoa – entre crianças que moram na mesma casa ou mesmo as que estarão aparecendo nas telinhas. Para tal, traremos diversas ferramentas lúdicas e musicais.
Laís Bim e Bruna Paiva são educadoras da equipe infantojuvenil, Mariana Grifo e Rafaela Cordeiro são educadoras da equipe físico esportiva do Sesc Avenida Paulista.
3 a 6 anos e responsáveis. Inscrições a partir de 21/5. Encontro pelo Teams.
Dia 29/5, sábado, às 14h
Vivência
“Olho mágico – a casa no corpo e o corpo na casa”
Com: Fernando Ogushi, Mariana Grifo e Nathália Triveloni
Por meio de uma lista de transmissão, serão enviadas propostas de ações e reflexões a serem experienciadas por bebês e seus adultos responsáveis, através de seus corpos dentro-com-e pelas suas casas. A cada dia um “disparador” diferente conterá uma proposta de atividade simples de ativação dos sentidos com objetos cotidianos – a casa no corpo – e derivando desta experiência, será sugerido um foco de observação e reflexão – o corpo na casa. Ao final, em um encontro síncrono, educadores/as e participantes poderão trocar impressões e compartilhar suas experiências.
Fernando Ogushi e Nathália Triveloni são educadores da equipe infantojuvenil, Mariana Grifo é educadora da equipe físico esportiva do Sesc Avenida Paulista.
De 6 a 36 meses e responsáveis. Inscrições a partir de 21/5. Envios pelo Whatsapp. Dias 24 a 28/5 e bate-papo a ser agendado entre os/as inscritos/as.
Para saber mais:
Primeira Infância: Prioridade Absoluta
Anne Binder é bióloga e educadora de atividades infantojuvenis do Sesc Avenida Paulista. Desde 2007 pesquisa e trabalha a ludicidade como processo educativo e há 10 anos atua no programa Espaço de Brincar do Sesc São Paulo. É entusiasta da primeira infância e do brincar em qualquer fase da vida.
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