Cartas ao Mundo. Colagem de Arnaldo Antunes.
A exposição-manifesto “Cartas ao Mundo”, calcada na obra de Glauber Rocha, e no contraste entre utopia e distopia, doença e cura, modifica-se aos olhos dos visitantes, com performances e suportes singulares, transformando-se a cada hora e criando diferentes ambientes para cada um dos segmentos videográficos.
“ACORDA HUMANIDADE!”
Trecho de A Idade da Terra
Um manifesto. Um grito. Uma necessidade urgente de (re)pensar o mundo atual com os olhos – cabeça e coração – de Glauber Rocha. Três universos em caos controlado, suportes para olhares apurados e críticos dirigidos para a realidade em que estamos inseridos, para um contexto de pouco caso e desinteresse pelo outro, de declínio da capacidade de convivência, do que é público, coletivo, e de tudo aquilo que isso representa.
“’Quis/mudar/tudo’: como no poema de Augusto de Campos, esse foi o mote desse projeto. Essa é a meta desse trabalho – o desejo de tomada de consciência e de mudança”, diz Bia Lessa, criadora e curadora da exposição Cartas ao Mundo, em cartaz no Sesc Avenida Paulista, em São Paulo, de 02 de abril a 29 de maio de 2022.
Ao visitar a mostra, o espectador assume outros papeis quando se depara com os três capítulos de uma narrativa cinematográfica que estimula, com realidades e ambientes que ganham vida em uma expografia que se transforma incessantemente, com cenários que se modificam durante a visitação. A exposição quebra as barreiras do que se costuma esperar de uma mostra e se encaminha para uma antiexposição, como diria Tadeusz Kantor.
Formas, cores, atos e reflexos conduzem o visitante e são conduzidos por ele. Performances sequenciais, realizadas por uma dezena de artistas, vão preenchendo, assim, os universos dos filmes Asfixia, Mercadoria e O Comum. Assim como a experiência de uma miríade de obras muitos artistas, reunidas com a contribuição especial de Vitor Garcez, Flora Süssekind, Ailton Krenak e Guilherme Wisnik.
Uma exposição-instalação, como define a curadora, com um tríptico fílmico cravado no coração de São Paulo e uma obra no Largo do Paissandu “que foi, realmente, o ponto inicial desse projeto e de seu esforço de reimaginar um trecho abandonado da cidade – e, nesse microcosmo, visualizar e pensar o país.”. Essa série, cujos capítulos, ou seja, três universos são vistos em contraste e diálogo mútuo e convidados a um trânsito entre espaço expositivo, e visualização em celulares, sites e tevês. Cartas ao Mundo é um projeto intencionalmente expansivo e será apresentado em diferentes plataformas, ampliando o diálogo com o público e criando diferentes formas de apreciação.
No dia 02 de abril, o tríptico será lançado ao mesmo tempo no Canal Curta (onde os três capítulos serão apresentados em sequência), Globoplay, site da Pinacoteca do Estado de São Paulo e do Instituto Inhotim. Também a partir desse dia o público poderá assistir aos filmes gratuitamente na Plataforma Sesc Digital. Contando, ainda, com a obra Black Sun, do artista francês Cyril Lancelin, que marcará presença no Largo do Paissandu, sinalizando que é naquela área da cidade, naquele território, que acontece virtualmente o projeto Cartas ao Mundo. A divulgação do tríptico fílmico nessas plataformas e a abertura da exposição no Sesc Avenida Paulista vão acontecer simultaneamente. A mostra conta com os apoios do Canal Curta, Consulado-Geral da França em São Paulo, Globoplay, Goethe-Institut São Paulo, Instituto Inhotim, LBM e Pinacoteca do Estado de São Paulo, e com realização Sesc.
A mostra acontecerá no Sesc Avenida Paulista, na avenida que é símbolo da cidade, de “cidade” e de “urbanidade”, um espaço expositivo aberto, escancarado, para a vida urbana e pronto para ser invadido por tudo aquilo que vem dela: seus olhares, seus sons, seus lamentos, suas opiniões, seus medos, seus desejos, seus sonhos, sua revolta, sua vida que pulsa.
“A intenção é participar de um movimento que diz em alto e bom som ASSIM NÃO. Não a uma cidade e a um país excludentes, que não consegue mais se ver”, anuncia Bia Lessa. E continua: “esse trabalho sai do fundo do estômago, passa pela garganta e cheira mal. Porque ele procura olhar de frente para o que nos sufoca. Porque ele existe com minhas tripas”. Aos 63 anos, ela dá voz a ações importantes para que este “não!” ganhe corpo, passo inicial para transformação. Assim como na obra de Glauber, em Cartas ao Mundo são evidentes a (r)evolução da linguagem, o diálogo com a atualidade, a quebra de barreiras e a ampliação dos limites, a ligação definitiva entre teoria e prática e o indispensável diálogo entre linguagens artísticas.
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A expografia é baseada numa ideia de doença e cura, se transforma a cada hora, criando diferentes ambientes a cada um dos capítulos.
A trilha sonora das performances é composta por Dany Roland. O Grivo, responsável pela trilha sonora das exposições, e Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes, responsáveis pela música tema.
O design de luz é de Paulo Pederneiras e a preparação dos atores é de Amalia Lima.
Compõem a exposição, três filmes de 60 minutos de duração cada, imagens das obras de muitos artistas, textos e colagens criadas por Arnaldo Antunes.
Esse capítulo, intitulado Asfixia, mostra a degradação da cidade, diante dos problemas oriundos das grandes metrópoles – problemas geográficos, sociais e econômicos. As questões são tratadas a partir de depoimentos, citações, poemas, imagens reais e imagens virtuais. Utilizamos a obra e a personalidade de Glauber Rocha como elemento condutor da narrativa. Móveis hospitalares, duas grandes telas, 300 sacos de lixo compõem a expografia.
O capítulo intitulado Mercadoria mostra a transformação dos cidadãos em consumidores, questionando os valores humanos. A partir da revolução industrial, o desenvolvimento tecnológico viabilizou a fabricação de produtos em larga escala, e consequentemente fez surgir o homem/consumidor.
O mundo fica de ponta cabeça, os móveis hospitalares ocupam o espaço aéreo, as obras de arte são transformadas em mercadorias.
O capítulo três tem como ponto de partida o conceito de Comum de Antônio Negri e Michael Hardt. Uma nova forma de ocupação do Largo do Paissandu é proposta, diante da reflexão visceral de Glauber Rocha. Um coro de narradores é constituído, dando ênfase a ideia de que a cidade é construída a partir da necessidade e do desejo plural.
O mobiliário hospitalar é substituído por um labirinto de tecido transparente, uma expografia fluida, caixas de papelão se transformam em suportes de obras.
Sobre Bia Lessa
Bia Lessa, paulista, artista responsável por trabalhos nas áreas de teatro, ópera, artes plásticas e cinema. Recentemente dirigiu os espetáculos: Macunaíma de Mario de Andrade, Grande Sertão Veredas de Guimarães Rosa, e Pi Panorâmica Insana, a partir de autores contemporâneos.
Foi responsável pelo Pavilhão Humanidade 2012, no Forte de Copacabana durante a Rio + 20, pelo Pavilhão do Brasil na Expo 2000 na Alemanha, pela Reinauguração dos Painéis Guerra e Paz na ONU em NY, pela Exposição Grande Sertão Veredas na inauguração do Museu da Língua Portuguesa, pelo Módulo Barroco na Bienal do Redescobrimento, pela exposição Claro e Explícito, e Itaú Contemporâneo: arte no Brasil 1981-2006, no Instituto Cultural Itaú.
Em cinema dirigiu os longas metragens Crede-Mi, Então Morri e finaliza Travessia, com estreia prevista para 2023. Dirigiu, ainda, as óperas Suor Angélica de Puccini, Cavalleria Rusticana de Pietro Mascagni, Pagliacci de Ruggero Leoncavallo, Don Giovanni de Mozart e Il Trovatore Giuseppe Verdi, para a reinauguração do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Trabalha atualmente na montagem de AIDA no Theatro Municipal de São Paulo, com estreia prevista para 02 de junho desse ano.
Seus espetáculos e filmes foram apresentados em diferentes países, entre eles no Centre Georges Pompidou, em Paris, no Festival de Outono de Madri, no Festival Theater der Welt, na Alemanha, na Berlinale, em Berlin, em São Francisco, Biarritz, em NY, entre outras cidades.
2 de abril a 29 de maio de 2022
Local: Praça (Térreo) – Sesc Avenida Paulista
Avenida Paulista, 119 – Bela Vista – São Paulo, SP
Grátis
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