De colegas de classe na faculdade a apresentadores do Estúdio CBN, há cinco anos Tatiana Vasconcellos e Fernando Andrade compartilham a mesma bancada – não literalmente durante a pandemia, já que os jornalistas passaram a gravar da própria casa. De segunda a sexta-feira, das 14h às 17h, a dupla entra no ar com notícias e, principalmente, análises aprofundadas sobre temas do cotidiano. “O rádio é imediatista e tem que falar sobre o que saiu agora, mas nós, nesse programa, temos a possibilidade de realizar uma entrevista de uma hora e tirar, com calma, todas as dúvidas sobre um determinado assunto”, conta Fernando. Para Tatiana, tão importante quanto esse exercício diário de mergulhar em assuntos mais complexos é poder explicar e mostrar aos ouvintes a diferença entre informação e opinião. “Acho que o jornalismo profissional nunca foi tão necessário num momento em que ele tem perdido relevância. Educação midiática é um tema que me atrai bastante, com o qual eu gostaria de trabalhar porque acho que devemos educar as pessoas para consumirem notícias”, diz. Neste Encontros, os radiojornalistas abrem seus microfones para falar sobre a chegada dos podcasts, a relevância das rádios comunitárias e a longevidade desse importante meio de comunicação de massa.
T.V.: Acho que quem escolhe uma carreira e se dá bem nela é porque teve sorte. Os interesses na vida mudam, inclusive os profissionais. Então, eu sempre penso nisso: que bom que eu gosto de ser jornalista e que bom que eu acertei. Na adolescência, quis ser muitas coisas antes de querer ser jornalista. Eu era atleta, então, eu pendia um pouco para a área de Educação Física e ainda pensei em fazer Fisioterapia. Mas, também pensei em fazer Arquitetura. A escolha do Jornalismo foi pela minha oratória, porque sempre fui falante, sempre gostei bastante de escrever e achava que estava tudo errado no mundo. Então, algo que juntava tudo isso era o Jornalismo.
F.A.: Aliás, a Tati e eu estudamos juntos (Jornalismo), na mesma sala, na mesma faculdade (Universidade São Judas, no bairro da Mooca) e nos formamos na mesma turma há mais de 20 anos. No meu caso, quando eu tinha 17 anos, as amigas da minha irmã mais velha me falavam que eu tinha uma voz linda. E aquilo me pegava de uma tal maneira que fui fazer curso de rádio no Senac. Daí, eu pensei: quero juntar rádio com mais alguma coisa e eu fui para o Jornalismo. Cheguei a trabalhar numa rádio de shopping. Aquela rádio que ninguém ouve porque você fica lá trocando as músicas, faz um comercial ou outro e anuncia o veículo no estacionamento que está com algum problema. Foi aí que comecei a pegar gosto pela coisa e achava o máximo falar pelo microfone. Fiz Jornalismo, fiz um curso de inglês fora do país, voltei e entrei na CBN em 2002 como trainee e ela foi minha verdadeira escola de jornalismo. Quando eu cheguei na CBN a Tati já estava desde 2000. Fui repórter, apurador, editor, chefe de reportagem e comecei a apresentar. Passei por todos os setores da rádio. Não tive nem como desviar do jornalismo e do rádio. Sou apaixonado pelo que faço.
T.V.: O rádio já teve sua morte decretada muitas vezes. Quando a tevê apareceu, quando a internet apareceu… E na verdade, o que o rádio sempre fez foi se incorporar nessas outras mídias e se transformar com essas novas tecnologias. O Fernando e eu trabalhamos com rádio desde antes dessa revolução tecnológica. Eu gravava matérias no cartucho, no “fitão” mesmo. Depois de velha, eu tive que aprender ferramentas que hoje os repórteres já nasceram sabendo, inseridos nessa lógica. O que eu sempre falo sobre o rádio e que a característica mais importante dentro da revolução tecnológica – e não à toa os podcasts se proliferaram desse jeito – é que a produção de conteúdo em áudio é algo que você pode consumir fazendo outras coisas. Nenhum outro meio de comunicação permite isso. A internet, você tem que estar ali olhando, lendo. Na tevê é a mesma coisa. Já no rádio, vou pedalando para o trabalho e ouvindo notícias. Nesse sentido, o podcast é a mesma coisa que o rádio: um conteúdo que você transmite e que o seu ouvinte consome podendo fazer outras coisas ao mesmo tempo. Esta sempre foi a característica principal do rádio e foi ela que permitiu aos podcasts explodirem desse jeito não só aqui, mas também no mundo. Outra característica é que o rádio sempre foi imediato. O veículo mais rápido é o rádio. Você precisa de um telefone ou de um orelhão para entrar no ar e transmitir uma informação. Nos blogs e sites não é assim, na tevê muito menos, porque precisa de um aparato tecnológico muito mais complexo. O rádio não: ele é dinâmico nesse sentido e com as redes sociais ficou ainda mais rápido. Mesmo antes das redes sociais, com o e-mail, eu já sentia essa diferença.
F.A.: Muitas coisas que fazemos estão ali na pauta que a gente produz. Outras coisas não estão e a gente produz ao interagir no programa. Começamos o Estúdio CBN às duas da tarde, e a primeira meia hora do programa é um trabalho com todas as chefias de reportagem, sobre os principais assuntos que os repórteres estão cobrindo. Então, na primeira meia hora, conversamos com os repórteres. Depois, fazemos uma entrevista de uma hora. O rádio é imediatista e tem que falar sobre o que saiu agora, mas nós, nesse programa, temos a possibilidade de realizar uma entrevista de uma hora e tirar, com calma, todas as dúvidas sobre um determinado assunto. Tati e eu juntamos nossas pautas de perguntas e assim fazemos a entrevista. Há cinco anos fazemos isso e hoje um já sabe o que o outro vai falar. Esse é o ouro do nosso programa: uma grande entrevista diária com muita análise, com perguntas difíceis.
T.V.: Acho que o jornalismo profissional nunca foi tão necessário num momento em que ele tem perdido relevância. Educação midiática é um tema que me atrai bastante, com o qual eu gostaria de trabalhar porque acho que devemos educar as pessoas para consumir notícias. Até para as pessoas serem capazes de diferenciar o que é notícia do que não é. O que é uma reportagem, o que é uma coluna, o que é uma opinião e o que é uma informação.
F.A.: A gente já chegou a fazer programas para explicar o que é uma crônica, o que é uma reportagem… Explicar o bê a bá do que é cada coisa porque muita gente ainda tem dificuldade para entender. É algo necessário. Já gastamos muitas horas de programa para explicar para os nossos ouvintes.
F.A.: Não tem uma fórmula. Temos muitas semelhanças no que pensamos, como agimos e nas bandeiras que temos.
T.V.: É igual a andar de bicicleta, eu acho. Quando eu cheguei, o Fernando já fazia esse horário, então, ele tinha, apesar do programa ter mudado muito, ele já estava acostumado a apresentar sozinho ou no máximo como locutor, aí eu cheguei. Então, eu me lembro de ter reencontrado o Fernando – já trabalhamos antes –, mas nessa nova reunião, conversamos sobre o programa: “É. A gente que vai carregar o piano. Estamos juntos”. A gente tem afinidade. Acho que não tem como explicar: tem a ver com o jeito como entendemos o jornalismo, como a gente olha para o mundo, o que a gente persegue no mundo e o que a gente acha essencial.
F.A.: Tem uma frase bem legal que diz que quando a internet acabar, quem vai anunciar é o rádio. Porque o rádio não vai acabar, ele vai sempre se reinventar. O rádio é simples: está no seu celular, no carro, no rádio à pilha… Em qualquer lugar. Me lembro que quando eu dava aula no Senac lá em 2000 e pouco, eu já falava para os alunos pensarem em podcast. Eu gastava uma baita energia naquela época falando de podcast, mas a gente não tinha pacote de dados. Ninguém conseguia pegar o celular e sair gastando dados. Aí, depois de muito tempo, conseguimos dados e, hoje, o rádio está na nossa mão.
T.V.: Em 2014, eu fui fazer uma oficina de entrevista para podcast. Lembrando que há uma discussão: podcast é uma linguagem ou um formato? Para mim, é um formato. São vários os modelos de podcast: a mesa redonda, a grande reportagem, o documentário em áudio. Vários jeitos de fazer um podcast, várias linguagens. Então, lá atrás, eu fazia uma oficina de entrevista com ex-alunos de uma escola de comunicação no Campo Limpo: Escola de Notícias do Tony Marlon, um método que ele desenvolveu e implementou com jovens e adolescentes da periferia do Campo Limpo. A gente passou um ano produzindo, fazendo, editando e subindo essas entrevistas em formato podcast num site chamado Periferia em Movimento. Essas entrevistas eram feitas necessariamente com figuras da região. Então, a oficina também passava pela escolha de quem a gente ia entrevistar, de quem é que produz saber nessa região e que tem o que dizer. Isso nada mais era do que a produção de conteúdo jornalístico em áudio para falar de pessoas da periferia de saberes que são produzidos pela periferia para as pessoas da periferia. Eu acredito nisso e acho que esse é um instrumento que tem sido bastante usado hoje.
F.A.: O jornalista Ricardo Gandour, que já foi nosso diretor, escreveu uma tese e lançou um livro sobre os buracos informacionais que temos no Brasil hoje. São lugares onde o jornal local acabou, a rádio local virou evangélica, não tem revista e nada. Então, políticos abraçaram esses locais via Facebook e via outras redes sociais. São eles quem estão dando a toada das notícias do que acha importante para eles. Isso tem sido feito há muito tempo, só que eu tenho visto o movimento de uma juventude nas periferias abraçando esse buraco informacional e colocando conteúdo via rádio, internet ou jornal de bairro. E esses buracos informacionais que existem hoje precisam ser preenchidos por essas figuras da periferia que têm o que dizer.
A edição de março/22 da Revista E está no ar!
Nas páginas deste mês, você conhece o projeto “Infindável Viagem: Takeo Sawada – artista, educador” (imagem de capa), composto por ações no Sesc Thermas de Presidente Prudente e no Sesc TV.
Além disso, a revista de março traz outros destaques, como a exposição “DARWIN, O ORIGINAL”, do Sesc Itaquera; um levantamento que, no mês da mulher, apresenta as ruas da capital paulista que homenageiam personalidades femininas; um depoimento dos jornalistas Tatiana Vasconcellos e Nando Andrade sobre sua rotina no rádio; um perfil da diva Elza Soares (1930-2022); uma reportagem sobre iniciativas que mostram a força de uma economia baseada na solidariedade e na coletividade; um passeio pelas ilustrações criadas para o experimento literário Folhetim, do Sesc Pompeia; uma entrevista com o economista Marcio Pochmann sobre modelos econômicos e o futuro da sociedade; e artigos que abordam os desafios do envelhecimento das pessoas LGBTQIA+.
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