Os fantasmas de Itaguá

11/08/2022

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Até o princípio do século XX, quem passasse pelas encostas do Morro da Espia, em Iguape, podia contemplar toda a exuberância da fazenda Itaguá, com o seu vistoso sobrado de pedra e cal construído nos anos coloniais, tendo ao lado o engenho de pilar arroz movido à roda de água.

A fazenda pertencia a uma abastada família da cidade, mais exatamente ao comendador José Jacinto de Toledo (1785-1854), que foi agricultor, capitalista e deputado provincial pelo distrito de Iguape (1850-1851), que então abrangia todo o Vale do Ribeira. Hoje, quem se aventura pelo local ainda avista as impávidas ruínas que resistem à inexorável ação do tempo.

O Itaguá tem muitas histórias, guardadas em suas pedras lavradas por habilidosos canteiros vindos do Reino. Vejamos algumas delas.

O fantasma do Itaguá

Todas as noites, um pescador saía de sua casa e analisava as águas do Mar Pequeno para ver se estavam propícias à pesca. Em certa ocasião, à meia-noite, o pescador estava sentado na calçada de uma fábrica de manjuba, que ficava bem em frente à maré.

De repente, apareceu, não se sabe de onde, um homem vestido de preto e com cartola, que perguntou ao pescador se ele já ouvira falar do Itaguá. O pescador respondeu que conhecia bem o local, que era um conjunto de ruínas de uma antiga fazenda de arroz e que hoje ninguém morava lá.

Então, o misterioso homem de preto disse-lhe que ele fora o proprietário do Itaguá e que lá vivera com a sua família há mais de cem anos. O pescador ficou perplexo. Porém, antes que pudesse falar alguma coisa, olhou em volta e se deu conta de que o homem de preto desaparecera…

A Dama do Itaguá

Certa noite, um professor foi caminhar nas proximidades do Itaguá. Pelas tantas, surgiu uma dama vestida de branco, muito bela e formosa, que não disse uma palavra sequer, nem fez qualquer gesto. Espantado, o professor, sem querer saber quem era a bela dama, debandou em louca disparada…

A Dama do Itaguá já foi avistada várias vezes. Alguns garantem que ela é a esposa do fantasma do Itaguá. Um casal romântico e fantasmagórico!

Os Garimpeiros do Itaguá

Rezam as crônicas da cidade que, às altas da noite, quando somente o tétrico piar das corujas e os gritos lancinantes dos morcegos se fazem ouvir, vários vultos vestidos de negro, saídos sabe-se lá de onde, começam a escavar determinados lugares do Itaguá.

Algumas pessoas afirmam ter visto tais vultos, os quais, dizem, estariam procurando pelo ouro que está escondido no subsolo do local. Alguns mais corajosos tentaram se aproximar desses vultos, mas ao chegar perto deles, os seres misteriosos corriam atrás dos curiosos, espantando-os… 

Os piratas do Itaguá

Dizem que, nos anos coloniais, ao tempo em que o casarão do Itaguá era uma importante fazenda, um navio pirata francês teria atacado o local. O dono, para proteger a sua fortuna, que era considerável, mandou um escravo enterrar as joias e moedas num lugar determinado. Porém, o servo foi morto pelos piratas, sem tempo de informar ao seu amo o local exato onde enterrara o tesouro, que nunca mais foi localizado nem pelo senhor nem por ninguém.

Choro de Pagãos

Segundo os antigos, na fazenda Itaguá morava um fazendeiro muito rico e igualmente malvado. Certa vez, o insensível senhor teve a cruenta ideia de mandar atirar, nas imediações da Pedra da Paixão, próxima ao Itaguá, todas as crianças para que as mães escravas trabalhassem mais e não perdessem tempo cuidando dos filhos. Dizem que, até alguns anos atrás, ouvia-se pelas bandas da Pedra da Paixão um lamurioso choro de crianças…

São histórias do Itaguá.

Texto: Roberto Fortes, morador de Iguape, graduado em Letras, escritor, poeta, historiador e jornalista.

*Esse conteúdo editorial faz parte da série online “Histórias Míticas do Vale do Ribeira” que integra a programação especial em comemoração aos 100 anos do prédio histórico do Sesc Registro, nominado “KKKK”, como ficou conhecido o conjunto arquitetônico instalado em 1922 pela Companhia Ultramarina de Desenvolvimento (de cujo nome em japonês -Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha- deriva a sigla dos quatro Ks). No canal do YouTube do Sesc, o público também pode acompanhar o processo de criação das ilustrações pelo artista Sávio Soares. Além de lendas e causos populares que povoam o universo da cultura tradicional regional, as publicações trazem também crônicas sobre locais, acontecimentos, paisagens e personagens históricos do Vale do Ribeira.

Acesse a playlist da série no YouTube.

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