“Que Revienten Los Artistas”, de Tadeusz Kantor. Foto: Carlos Furlan
Tadeusz Kantor nasceu na Polônia, em 1915, e tornou-se bastante conhecido por atuar na encenação, happening, performance, pintura, cenografia, desenho, escultura e objeto com o objetivo de expressar os duros tempos que viveu na segunda metade do século XX. Tendo no palco de sua juventude a primeira e segunda guerras mundiais e, ao fim da vida, a queda do muro de Berlin, “Kantor é o século XX”, como afirmou Lech Stangret, sobrinho e ator nas suas principais peças.
Diante deste retrospecto, a obra de Kantor foi fortemente influenciada pelo Construtivismo, Dadaísmo, Tachismo, Surrealismo e outros inúmeros movimentos artísticos que permearam o século passado. Derivaram desses contatos elementos chave como: a recusa do psicologismo, o lado infernal, o catastrofismo, a extrapolação das concessões tradicionais de tempo e espaço, além de tomar a “destruição” e a “negação” como métodos artísticos.
The Water Hen [A Galinha D’Água], 1967, colagem composta por personagens de Tadeusz Kantor. Foto de Jacek Maria Stoklosa.
Kantor nas artes visuais e no teatro
Estudando na Academia de Belas Artes da Cracóvia, entre 1934 e 1939, Kantor teve contato direto com o Karol Frycz, um dos principais cenógrafos de teatro da primeira metade do século XX, na Polônia.
Em 1947, antes do alinhamento da Polônia com o bloco soviético, Kantor viaja a Paris, onde entra em contato com cubistas e surrealistas, e em particular com o pintor Roberto Matta, sofrendo a influência da sua pintura: a desumanização da figura humana.
Imediatamente após a segunda guerra, ele trabalha como cenógrafo, atividade a qual se ocupa durante toda a década de 60, sobretudo trabalhando com cenários abstratos.
Quando o governo polonês começa a promover o Realismo Socialista como “arte oficial”, Kantor praticamente desaparece da cena artística. Em 1955, retorna a Paris, onde conhece a obra de Pollock, o dadaísmo e o neo-dadaísmo. Neste ano ele finalmente exibe suas pinturas criadas desde 1949.
Funda também na Cracóvia em 1955, o Teatro Cricot 2, que manteve-se em sua direção até 1990. Com a companhia, Kantor ficou mundialmente conhecido nos anos 1970/80 com o espetáculo “A classe morta”, de 1967.
Seguindo a sua criação, surgem em seguida o Teatro Zero, em 1963, Teatro Happening, em 1967 e finalmente, em 1975, o Teatro da Morte. Fazem parte desta última fase os espetáculos “Wielopole-Wielopole”, “Que morram os artistas”, “Aqui não volto mais” e “Hoje é meu aniversário”.
Além disso, em sua obra, se destaca a influência de Gordon Craig, através do conceito da supermarionete, em que fazendo referência as marionetes ele coloca os atores desprovidos de vaidades e emoções, logo livres para poder estar dentro da arte da encenação. Podemos citar ainda o conceito ready-made de Marcel Duchamp, que levou Kantor a ver o objeto comum como “registro do mundo”, guardião da memória e anunciador da morte.
A exposição Máquina Tadeusz Kantor
A montagem e ambientação no ginásio receberá uma construção de dois níveis, em formato de plataforma.
Ocupando boa parte da unidade, a exposição começa na Área de Convivência, com a apresentação da Máquina de Aniquilamento, que, na opinião dos curadores Jaroslaw Suchan, polonês, historiador da arte e diretor do Muzeum Sztuki em Lódz, e dos brasileiros Ricardo Muniz Fernandes, sociólogo, editor e produtor de eventos culturais, e Sebastião Milaré (in memorian), constitui uma metáfora de toda a obra de Kantor.
O espaço seguinte será preenchido pelos documentários relacionados com a criação e a vida de Kantor, bem como com depoimentos de diretores, atores e críticos sobre a importância da obra do artista polonês. A comedoria, por sua vez, será transformada numa interpretação do Café Europa, um espaço imaginado por Kantor para o entrecruzamento de tempos, onde se reuniriam artistas e pensadores de épocas distintas. Lá, os visitantes poderão tomar seus cafés e consultar diversas obras, tanto sobre Kantor quanto sobre autores a ele relacionados.
No ginásio serão apresentados tanto os objetos cênicos originais de algumas peças de Kantor, quanto reconstruções fiéis destes, além de pinturas a óleo, aquarelas, guaches, desenhos e colagens do artista multifacetado, bem como uma rica documentação fotográfica e cinematográfica. Nesse espaço, os visitantes poderão encontrar, entre outras coisas, a cadeira do espetáculo “Que morram os artistas!”, de 1985, o bengaleiro de “Dainty Shapes and Hairy Apfes” [(“Formas delicadas e macacos peludos]”), de 1973, reconstruções dos elfos e da Goplana da peça “Balladyna”, apresentada em 1943. Algumas dessas obras serão acompanhadas de um fragmento do filmes das performances das quais fizeram parte, como aquele realizados por Dietrich Mahlow, “Kantor tu jest” [Kantor aqui], de (1969), a partir da performance “Die Grosse Emballage” [A grande embalagem]. As obras selecionadas para a exposição estabelecem um diálogo profundo e histórico com a vida de Kantor e sua época, assombrada pelos horrores da guerra.
Conforme escreve o curador brasileiro Ricardo Muniz Fernandes, “a exposição não é uma retrospetiva, mas um mecanismo em funcionamento; não é uma simples apresentação das obras, mas está ligada com a reinvenção do que é vivo e vivido por Kantor e sua época. É um espaço em processo. ‘Máquina Kantor’ é constituída por várias máquinas interligadas com outra multidão de máquinas — os espectadores —, num fluxo interligado e contínuo”.
As salas que compõe a mostra são, de acordo com o curador polonês Jaroslaw Suchan, “os capítulos que mostram sucessivas realizações da MÁQUINA-KANTOR, introduzidas no ritmo dos manifestos enunciados por Kantor”.
Kantor na arte do século XX
Algumas curiosidades importantes sobre o artista.
-Kantor teve contatos pessoais e intelectuais com alguns daqueles artistas ligados a Bauhaus. Falava neles de forma direta, pessoal e evitava a idolatria ou o intelectualismo, alguns deles são: Walter Gropius, Mies Van Der Rohe, Wassily Kandinsky, Paul Klee, László Moholy-Nagy e Oskar Schlemmer.
-Kantor exigia que os técnicos e figurinistas trabalhassem nas salas contíguas, senão na mesma sala. Tudo acontecia ao mesmo tempo, era um enorme atelier de artesanato.
-O “Happening Panorâmico do Mar”, realizado em 1967, na cidade de Lazy, onde ele, de pé sobre uma cadeira, rege o mar como um maestro, já foi recriado por artistas como Marina Abramovic e Bob Wilson. As fotografias serão trazidas para exposição.
-Quem se lembra do clássico filme The Wall, de Alan Parker, cujo enredo foi baseado inteiramente no álbum homônimo da banda britânica Pink Floyd, pode associar facilmente a peça “A Classe Morta” de Kantor. Encenada em 1975, esta é considerada a sua obra-prima, em que personagens mortos interagem com bonecos deles mesmos, quando crianças, fazendo uma alusão a não-morte. A filmagem da peça foi realizada pelo emblemático cineasta polonês, Andrzej Wajda.
-Remetendo ao misto de lenda urbana com crenças de culturas indígenas que acreditam que a fotografia e capaz de roubar a alma, através do objeto “A Invenção do Sr. Daguerre”, é possível ver um cruzamento entre câmera fotográfica e uma metralhadora. A ideia de Kantor, era de retratar a fotografia como morte.
-Surgida em 2002, a Cia. Antropofágica, realizou em 2006, o espetáculo “Os Náufragos da Rua Constança”, amplamente influenciada pelo filme “O Anjo Exterminador” de Luis Buñuel e por duas grandes áreas de interesse: a questão do modus vivendi burguês e a imersão no surrealismo e no teatro de Tadeusz Kantor. Em 2010, a companhia também, como parte de sua pesquisa de linguagem, realizou um ciclo de estudos teóricos e práticos sobre o teatro de Tadeusz Kantor, que contou com a participação do professor Michal Kobialka, um dos maiores especialistas em Kantor no mundo. Michal também virá para a programação paralela da mostra.
-O multinstrumentista André Abujamra, líder das bandas ‘Os Mulheres Negras’ e ‘Karnak’, já revelou: “Nasci no teatro e tudo que faço com música tem o show, a luz, a cena junto. Para mim, tem que ter Tadeusz Kantor, Denise Stoklos e muito mais no show”. Seu pai, o grande dramaturgo Antônio Abujamra, também já encenou um dos fantasmas de Kantor em sua peça “O Que Leva Bofetadas”, de 2004.
-Lançado em 2013, em uma parceria entre Edições Sesc São Paulo e a Editora Perspectiva, o livro O Teatro da Morte reúne textos de Tadeusz Kantor que ampliam a compreensão do fenômeno teatral.
o que: | Máquina Tadeusz Kantor: teatro + happenings + performances + pintura + outros modos de produção |
quando: | De 19/08 a 14/11. Segunda a sexta, das 11h30 às 21h30. Sábados e feriados, das 10h às 18h30 |
onde: | Sesc Consolação | Rua Doutor Vila Nova, 245 | 11 3234-3000 |
ingressos: | Grátis – Consulte também a programação paralela no Portal |
Utilizamos cookies essenciais, de acordo com a nossa Política de Privacidade, para personalizar e aprimorar sua experiência neste site. Ao continuar navegando, você concorda com estas condições.