Com transmissão pelo perfil do Sesc Pompeia no Instagram, o encontro trouxe discussões
acerca dos caminhos profissionais das ex-atletas da seleção brasileira de futebol feminino.
No último dia 8 de dezembro, o Sesc Pompeia recebeu as pioneiras Meg, Marcia Tafarel e Elane
da seleção brasileira de futebol. O evento, mediado pela jornalista Mia Lopes, trouxe, além da
contextualização da efeméride dos 30 anos da Primeira Edição da Copa do Mundo FIFA de
Futebol Feminino realizada na China em novembro de 1991, os caminhos percorridos pelas
atletas após o encerramento de suas atividades com o futebol.
O papo, que está disponível no IGTV do Sesc, percorreu cada história a partir da
regulamentação do futebol feminino no Brasil, e as convidadas Elane, Tafarel e Meg discorreram
sobre as dificuldades, a estrutura precária da época e como a resiliência é a marca dessa
geração, que quebrou tabus para que novas gerações pudessem colher diferentes frutos.
O encontro foi um jogaço. Um bate-bola em sintonia para responder todas as perguntas e
relembrar momentos, em um paralelo com o atual Futebol de Mulheres. Uma celebração à
natureza feminina que é múltipla e plural e que, sem dúvida mostrou um braço da história
feminista que aconteceu na década de 80, quando dentro de suas próprias casas e famílias,
essas mulheres já eram as donas da bola como goleira, zagueira e meio campo.
Não havia um calendário de competições femininas e, na precariedade dos treinos, era com os
garotos do juvenil (de 15/16 anos) que as jogadoras acreditavam que manteriam o
desenvolvimento do trabalho após a primeira Copa em 1991. Não havia investimento nas
seleções de base e as atletas também não participavam de amistosos. Não existiam, para elas,
o intercâmbio e as viagens, que hoje são apontados pelas próprias jogadoras, como um grande
salto na evolução do futebol feminino. Além é claro, da criação das seleções Sub 17 e Sub 20.
Ainda assim, entendendo o futebol de mulheres no Brasil, vale contextualizar que ele nasce
preto e pobre, na periferia. A misoginia no esporte afasta as oportunidades, não havendo
incentivo para essas meninas. A periferia e as comunidades, berços de talentos e potenciais
legítimos estão submetidos a uma nova estética do futebol feminino, o que para Meg, Tafarel e
Elane é uma perda para a evolução do esporte no país.
A necessidade de buscar oportunidades fora do Brasil e o quanto era raro encontrar um plano de
gestão de carreira que colocasse as atletas em posições mais confortáveis de vida. Esse era o
cenário da época. Marcia migrou para o Futsal juvenil e foi morar nos Estados Unidos. Meg já
saiu do interior com o foco em estudar Educação Física. O sustento era ser educadora,
acumulando 35 anos no ofício de lecionar.
A falta de oportunidade nos estudos, para muitas representou a mudança radical de profissão.
Do 1º gol da seleção brasileira aos 30 anos de invisibilidade. Elane fez a transição para tornar-se
motorista e, mais uma vez, enfrentou o preconceito na única coisa que podia escolher na época,
dirigir ônibus. De origem humilde, o sonho era mudar a vida de toda a família para melhor.
A diferença entre o homem e a mulher no mercado de trabalho fica ainda mais escancarada com
as oportunidades de expansão de carreira que, para as mulheres do futebol, segue limitada pelo
machismo. De maneira geral, essa conduta está generalizada no mercado esportivo nacional.
“O sonho de todo técnico que trabalha com o futebol feminino é ir trabalhar com o masculino
para ganhar mais dinheiro. O nosso sonho é trabalhar com a nossa modalidade!” – Disse Marcia
Tafarel ampliando o discurso sobre a diversidade e equidade de gênero que ainda precisam ser
amplamente discutidas no esporte brasileiro.
Falta evoluirmos na representatividade. Falta acesso aos cursos de especialização, que ainda
são elitizados, enquanto é preciso viabilizar o acesso, para que a maioria tenha um plano de
gestão de carreira em comunhão com a sua paixão, mas principalmente por sua competência.
Com o patriarcado generalizado no esporte vemos a falta de investimento e a diferença de
oportunidades que aconteceram ao longo desses 30 anos, com poucos clubes incentivando as
jogadoras e ausência de planos de aposentadoria para atletas profissionais, que deveriam ser
um benefício para essas mulheres.
A busca da mulher por independência acontece hoje em todas as profissões. A pergunta que fica
é: “Onde estão as profissionais do mercado esportivo?” Quando vamos ver a técnica, a gestora
de clubes e entidades, as lideranças com o objetivo e a representatividade legítimos para
desenvolver a mulher no esporte em sua totalidade?
A paixão foi maior do que o preconceito e as agressões verbais sofridas por essas pioneiras. A
objetificação de seus corpos, através de exigências como usar maquiagem também faziam parte
da rotina. O Futebol era marginalizado e isso ficava claro em frases como a que Elane trouxe:
“aquilo ali não é ambiente para elas”, referindo-se a estar em campo.
Motivação para que as mulheres busquem espaço no mercado é essencial, principalmente
quando é preciso provar, muitas vezes em dobro, a competência para ser uma profissional do
esporte. Fica a reflexão, quantas atletas brasileiras pioneiras em suas modalidades não tiveram
essa chance? Nomes importantes sequer tiveram uma oportunidade para comandar uma
seleção, mesmo sendo grandes jogadoras e fazendo excelentes trabalhos na base.
Muito apadrinhamento e pouca busca por competência e conhecimento no mercado foram
citados como problemas recorrentes nas oportunidades que surgem. É urgente a capacitação de
meninas do Futebol e que o mercado esteja aberto às mulheres. As entidades precisam dar o
exemplo.
É unânime o desejo entre essas jogadoras pela visibilização dos feitos dessas mulheres
pioneiras. Da compreensão de que se faz urgente a profissionalização de todas as meninas que
jogam futebol, com planos de carreira consolidados e aposentadoria compatíveis com a
dedicação. Vale dizer que o reconhecimento de todas as jogadoras nunca virá tarde. E claro, um
título mundial faria esse time muito feliz!
A live foi a concentração para que essas mulheres incríveis entrassem em campo em
Teresópolis. A ansiedade e a alegria desse reencontro estava presente no toque de bola que
aconteceu antes da grande festa na Granja Comary. Finalizamos com uma frase da Meg que
resume o desejo de defender o espaço da mulher dentro e fora dos campos: “Vai ser ruim entrar
a bola!”
Texto: Renata Lopes
Colaboração: Lu Castro
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