Rios e Ruas no Sesc Ipiranga, vista do rio que dá nome ao bairro | Foto: Mezclador/Rogério Nunes

O urbanista José Bueno e o geógrafo Luiz de Campos Jr. são fundadores do Instituto Harmonia – Sustentabilidade, entidade que visa promover o reconhecimento do potencial dos elementos naturais das cidades. Uma das estratégias é revelar os rios “invisíveis”, cursos d’água soterrados ou escondidos sobre construções.

A dupla criou a oficina e expedição Rios e Ruas, que busca sensibilizar a população para uma melhor convivência com a natureza urbana.

José Bueno explica como esta atividade – que será oferecida em diversas unidades do Sesc SP em junho – funciona. Leia a seguir:

Por que chegamos aonde chegamos?

Aqui está o coração da vivência Rios e Ruas. Na primeira etapa da atividade, desenvolvida de forma teórica e lúdica, José Bueno e Luiz de Campos Jr. levam os participantes a irrigar com a imaginação todo o tecido urbano de São Paulo. Por meio de perguntas e provocações, despem a capital de seus trajes mais habituais – cimento e asfalto – para revelar seus inúmeros cursos d’água. “A vivência parte do estranhamento das pessoas em descobrirem o volume de água que existe, mas está escondido na cidade”, conta Bueno. “Para isto, primeiramente estabelecemos uma linha do tempo e explicamos que São Paulo não foi sempre assim. Depois, montamos com a ajuda do grupo um quebra-cabeça de 12 metros quadrados que ilustra apenas nossos rios – os shoppings, restaurantes e cinemas não aparecem propositalmente, pois o intuito é motivar os participantes a olharem com maior interesse para o lugar em que moramos e questionar por que chegamos aonde chegamos”, completa.

Instrumentos que todo mundo tem

De forma complementar à formação teórica, a etapa prática desenvolvida na vivência Rios e Ruas requer instrumentos sofisticados, mas que todo mundo vive carregando consigo: olhos, nariz, ouvidos e mãos. Em caminhadas que giram em torno de três a quatro quilômetros, José Bueno e Luiz de Campos treinam o grupo para identificar, ver, cheirar, ouvir e tocar as águas que, mesmo escondidas, teimam em brotar por toda São Paulo. Isto não significa, porém, que ao se juntar à excursão nos arredores do Sesc Pinheiros você entrará em contato com as poluídas águas do rio Pinheiros. “Este seria um trajeto óbvio”, explica Bueno. Neste exemplo, soa muito mais interessante ir atrás dos afluentes Verde e Corujas, normalmente confundidos com canais de esgoto. “Afinal, um rio não existe sozinho!”, lembra o urbanista.

A cidade na palma da mão

Após participar da expedição Rios e Ruas, o que fazer com tanta informação? “A informação pouco importa, porque é um fator que não emociona”, dispara Bueno. “O valor está na experimentação e na consequente geração de conhecimento. Isto sim mexe com as pessoas, faz com que queiram encurtar sua distância dos problemas e tomar a decisão política – e aqui não falo de um prefeito ou presidente, mas de compreensão do papel como indivíduo, como cidadão – de se apropriar da cidade”.

Neste sentido, o trabalho da Rios e Ruas não começou em São Paulo por acaso. A dupla acredita que a capital ofereça de forma implacável o desafio de romper com a cultura de distanciamento entre concreto e natureza. “Estamos no pior e no melhor lugar do Brasil para trabalhar. Se pudermos abrir aqui 300 metros de um rio que hoje está soterrado e conseguirmos mostrá-lo para a população, será possível fazer o mesmo em todos os demais 5 mil municípios do Brasil”.